Divagações: Anatomy of a Murder

O direito americano é algo interessante de se ver. Os advogados e promotores se espezinhando, o juiz sempre justo e com manias estranhas, a ...

O direito americano é algo interessante de se ver. Os advogados e promotores se espezinhando, o juiz sempre justo e com manias estranhas, a formação do júri, as testemunhas ensaiadas se perdendo após uma boa enxurrada de perguntas espertas, as provas surgindo e sendo acrescentadas nos autos a todo instante e a tensão antes da decisão final. Em 1959 as coisas já eram exatamente assim, embora com algumas diferenças nos bons costumes.

Anatomy of a Murder é um típico filme de tribunal. Não vemos o crime, apenas como o advogado chegou em casa e pegou o caso sem nem entender direito do que se tratava. Paul Biegler (James Stewart) costumava ser um bom promotor e a vida fora do funcionalismo público estava se tornando difícil, o que não quer dizer que não poderia ser um excelente advogado se quisesse. Quando a bela Laura Manion (Lee Remick) liga, ele fica na dúvida sobre aceitar ou não defender o marido que matou o estuprador da mulher. O jeito frio do tenente Frederick Manion (Ben Gazzara) também não ajuda e o comportamento de Laura é capaz de colocar até o próprio estupro em questão. Não que você lembre muito disso quando a rivalidade entre Biegler e o homem que está em seu velho cargo (Brooks West) chega ao auge e se confunde com o julgamento.

Mas ele aceita o caso – ou não existiria muita história para contar. Ele fala diversas vezes com marido e mulher, procura as pessoas que cercam o homem morto, coloca sua secretária (Eve Arden) e seu amigo beberrão (Arthur O'Connell) para trabalhar. Enfim, ele faz de tudo para defender seu cliente. A medida que o julgamento se desenrola, o espectador se sente – praticamente – como um dos jurados. Você não sabe se Laura foi realmente estuprada por aquele homem, você não sabe como era o relacionamento daquele casal, você não tem ideia de como o tenente reagiu à notícia. As únicas coisas que você sabe são as mesmas que o advogado sabe. O crime nunca é mostrado.

É por isso que o filme é brilhante. Ele nos aproxima da sensação de estarmos envolvidos em algo perigoso, com dúvidas sobre em quem confiar, sem saber o que realmente aconteceu e sentindo uma grande vontade de descobrir a verdade. Com a imensa vantagem de estarmos confortavelmente sentados no sofá de casa e longe de qualquer perigo.

É claro que o tempo deu ares antiquados a algumas coisas vistas em Anatomy of a Murder, mas nada que prejudique o resultado final. Mesmo sem cenas de ação, o diretor Otto Preminger conseguiu um filme bastante ágil, apostando nos personagens dúbios e nas relações entre eles. Os 160 minutos de duração mal são sentidos (em pensar que os 130 minutos de Eat Pray Love demoram eras para passar).

Só é uma pena que o título e o filme não combinem muito, pois o nome dá a impressão errada de que haverá respostas sobre do que um assassinato realmente é feito. O filme, no entanto, é um suspense delicado e bem tramado, onde cada detalhe é importante e o espectador precisa ficar atento, na esperança de tentar descobrir mais do que o que está sendo mostrado – bom, talvez seja essa a intenção de nomear o filme assim.

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