Divagações: One Flew Over the Cuckoo's Nest

Às vezes eu me pergunto se o Jack Nicholson se incomoda muito em ser conhecido como tendo “cara de louco”. Não sei se isso ajudou ou atrapa...

Às vezes eu me pergunto se o Jack Nicholson se incomoda muito em ser conhecido como tendo “cara de louco”. Não sei se isso ajudou ou atrapalhou na carreira dele, mas em 1975 ele já devia estar bem escolado sobre como escolher papéis – e suponho que essa habilidade apenas aumente com a experiência. De qualquer forma, ninguém sabe exatamente se o seu personagem em One Flew Over the Cuckoo's Nest tem ou não problemas mentais.

Mas convenhamos que bem certo da cabeça ele não é. R.P. McMurphy é um condenado que é transferido de uma prisão rural para um manicômio porque os guardas desconfiam que ele não bate muito bem. Aparentemente, ele não faz muita questão de mostrar se é pirado – mas também não se esforça para apresentar normalidade. Com o tempo, acaba se socializando com os demais internos e sua permanência é acertada. No entanto, ele se sente enganado quando descobre que só vai poder sair quando os médicos permitirem e não quando a pena a que foi condenado acabar. A partir daí, cresce em seu íntimo a ideia de fugir.

Além de Jack Nicholson, se destacam no elenco Brad Dourif, Will Sampson, Christopher Lloyd e Danny DeVito como os demais internos, sem contar Louise Fletcher, que está ótima como a rígida enfermeira Ratched. Obviamente, todos são favorecidos pela direção firme e delicada de Milos Forman, que valoriza mais os personagens que as próprias situações. Sem que você perceba, cada um dos colegas de internamento vai ganhando personalidade e seus problemas crescem em dimensão. Eles fazem o protagonista parecer um pouco mais “normal”, mas a interação é tão fácil e amigável, que a dúvida continua.

Infelizmente, o filme envelheceu bastante. Mesmo que a palheta de cores de um hospital e os uniformes permaneçam praticamente os mesmos, os cabelos mudaram, assim como os tratamentos psiquiátricos e as exigências de segurança nos hospitais (sinceramente, ele poderia ter fugido muito fácil, sem a necessidade de nenhum plano elaborado). De qualquer forma, fica um retrato poético de uma realidade triste (embora a situação fosse bem pior por aqui). Aliás, esse é um dos raros filmes em que a melancolia está presente nos detalhes, enquanto todos tentam disfarçar – inclusive se sentindo realmente felizes de vez em quando.

Mas não adianta, o filme é de Jack Nicholson e sua atuação é surpreendente. Mesmo tendo um personagem difícil, politicamente incorreto e “indecifrável”, ele encanta e chega a conquistar a simpatia do público. Com motivações bastante contestáveis, ele é um mistério para quem vê o filme e até para quem está participando da história. Não se sabe se é inteligente, malandro ou burro; interesseiro, desapegado ou grande amigo; são, perturbado ou doente. Só mesmo Jack Nicholson para transformar essa grande incógnita em charme.

One Flew Over the Cuckoo's Nest não é um filme fácil, para comer com um balde de pipoca na mão. É necessário ter atenção e alguma sensibilidade. Não é um filme alegre, mas não chega a ser excessivamente dramático. Parece um dia chuvoso e cinzento, mas sem muito vento.

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