Divagações: Epic

Apesar de alguns ufanistas defenderem o trabalho do Blue Sky Studios unicamente pela participação de brasileiros como Carlos Saldanha e...

Apesar de alguns ufanistas defenderem o trabalho do Blue Sky Studios unicamente pela participação de brasileiros como Carlos Saldanha e Renato Falcão em suas fileiras, a verdade é que nunca me empolguei com a produção do estúdio. Quer seja pela constante deterioração da franquia Ice Age, quer pelas iniciativas genéricas de lançar novas propriedades intelectuais como Robots, ainda falta a eles a sutileza ou o capricho de suas principais concorrentes.

Assim, Epic prometia duas coisas bastante distintas: poderia afundar sob o peso da própria pretensão – convenhamos que é preciso uma boa dose de confiança para dar esse título a um filme – ou poderia dar novas direções ao estúdio,  introduzindo uma bem vinda injeção de densidade à filmografia do Blue Sky. Infelizmente, os prospectos, ao menos nos trailers, pareciam apontar mais para a primeira do que para a segunda opção.

Mary Katherine (Amanda Seyfried/Luisa Palomanes) é uma jovem da cidade que vai reencontrar com seu pai, o excêntrico professor Bomba (Jason Sudeikis/Murilo Benício), depois de muitos anos de separação. A relação dos dois não está lá essas coisas e a obsessão do professor em provar que existem pessoas minúsculas morando na floresta não ajuda muito a reverter o quadro. Porém, o ceticismo de Mary acaba indo por água abaixo quando ela é encolhida pela rainha Tara (Beyoncé Knowles/Miriam Ficher) e se vê no meio de um conflito entre o vilão Mandrake (Christoph Waltz/Mauro Ramos) e os homem-folha, liderados por Ronin (Colin Farrell/Daniel Boaventura).

Por mais que seja bom ver personagens mais humanos em animações, normalmente entulhadas por animais e seres inanimados de todo o tipo, Epic falha em balancear a verossimilhança e a fantasia de uma forma crível. O roteiro força um maniqueísmo insuportável em uma obra cuja temática é o conflito. Isso é relevável quando se trata de uma comédia, já que o antagonista raramente precisa ser levado a sério, mas quando temos uma aventura é imprescindível uma motivação melhor que ‘preciso destruir tudo’.

O filme também sofre com problemas de ritmo, não havendo o senso de crescimento e evolução necessário ao roteiro. As situações parecem ser um pouco jogadas a esmo, faltando uma linha condutora que poderia efetivamente salvar o filme. Aos personagens falta o carisma que aparentemente só a Pixar consegue passar, sendo esse mal ainda mais presente nos coadjuvantes, que servem apenas para soltar meia dúzia de piadinhas bobas não merecedoras de algo mais do que um sorriso amarelo.

Apesar disso, Epic tem algumas boas qualidades, sendo visualmente lindo e se prestando muito bem a ambientar o filme em meio ao universo diminuto, sem pecar na modelagem e nas texturas. Elas são muito bem transpostas para as cenas de ação e de combate e, quanto a isso, a equipe de produção não fica devendo para ninguém.  As relações entre os personagens também tem seus pontos de redenção, tendo um tratamento um pouco mais denso do que costumamos ver em outras animações.

Infelizmente, a dublagem nacional mais atrapalha do que ajuda. Murilo Benício e Daniel Boaventura são um lembrete constante da detestável prática de colocar atores no lugar de dubladores de verdade, presenteando com uma dublagem inflexível e pouquíssimo empolgante. Eles atrapalham ainda mais o trabalho de gente como Luísa Palomanes e Sérgio Cantú, que, apesar do trabalho pouco memorável, demonstram a competência de profissionais do ramo.

Epic pode se mostrar uma experiência decepcionante, porém não é um filme de todo mal, certamente ficando bastante acima do filme anterior do estúdio – Ice Age: Continental Drift – em questão de qualidade. Para as crianças que vão ao cinema, talvez esses defeitos estejam longe de serem aparentes, sendo um sopro de ar fresco em frente às infinitas comédias com animais que permeiam as animações ocidentais. Porém, se você gostaria de ver uma animação realmente boa com gente minúscula, eu recomendaria muito mais o ótimo Kari-gurashi no Arietti.


Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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