Divagações: Jean-Michel Basquiat - The Radiant Child

Foi através do filme Basquiat que entrei em contato com o trabalho do artista Jean-Michel Basquiat pela primeira vez. Passado nos anos 1...

Foi através do filme Basquiat que entrei em contato com o trabalho do artista Jean-Michel Basquiat pela primeira vez. Passado nos anos 1980, o longa-metragem baseava-se na vida do pintor (Jeffrey Wright), retratando sua ascensão meteórica, sua amizade com Andy Warhol (David Bowie) e sua relação com as drogas. A partir desse ponto, comecei a perceber a importância de seu legado e a encontrar seu nome em outros locais, como livros, artigos e filmes.

Em Jean-Michel Basquiat: The Radiant Child há a mesma história, porém, sob a forma de documentário. Entre os principais entrevistados estão a ex-namorada Suzanne Mallouk, a curadora Annina Nosei, os pintores Rene Ricard e Julian Schnabel, a estilista Maripol e o músico Fab 5 Freddy.

A própria diretora do filme, Tamra Davis, também dá seu depoimento, onde deixa explícita sua amizade com Basquiat. Embora isso não atrapalhe a fluidez do documentário, é uma situação pouco usual e causa estranheza. Inclusive, acredito que essa proximidade dela com o pintor tenha sido essencial para o enfoque que o filme tomou. Fala-se muito mais sobre o artista do que sobre a arte propriamente dita.

Essa maneira de contar a história, claro, não é necessariamente ruim – embora seja mais recomendada para os iniciados. Um artista de Nova York do final do século XX, Basquiat tinha suas origens no grafite e seus trabalhos são de difícil compreensão. Para quem nunca ouviu falar, é estranho ver todas essas pessoas chamando de brilhante e poético algo que mais se assemelha a um monte de rabiscos de criança. Ainda assim, pequenos episódios da vida do artista, relatados ao longo do filme, dão mais significado às figuras e palavras que povoam suas pinturas e desenhos.

Como Basquiat realizava uma produção frenética, o espectador é o tempo todo bombardeado com imagens de seu trabalho e, principalmente quando se fala em referências, fica mais fácil perceber quem ele foi. A história de sua família também acrescenta dados interessantes, especialmente sua relação com o pai. Já a amizade com Andy Warhol denota o começo da decadência, quando, depois de sofrer física e emocionalmente para atender às espectativas, o pintor começa a ser deixado de lado.

Outro ponto importante é relação de Basquiat com o dinheiro e a fama. Na adolescência, depois de sair de casa, ele começou a viver praticamente como um mendigo, mas seu grafite já chamava atenção. Aos 18 anos, entrou para o círculo dos artistas, começou a produzir em telas, expôs e vendeu quadros, seu trabalho se valorizou e alcançou valores estratosféricos, eles ganhou muito dinheiro, começou a se envolver com drogas e faleceu aos 27 anos. Convenhamos que muita coisa aconteceu em pouco tempo e que qualquer um teria dificuldade em lidar com essas situações.

Além disso, tudo se passa há poucos anos, mas o mundo era muito diferente – e mais cruel para pessoas como Basquiat. Em uma entrevista da época, mantendo um sorriso no rosto e um balanço de inquietação pueril, ele desconcerta um apresentador que chama sua arte de “primata”. Contudo, situações como essa são desagradáveis, ainda mais para uma pessoa sensível e que vive com luxo em certos círculos, resultando em um contraste bastante incômodo e de difícil adaptação.

De qualquer forma, um dos aspectos que mais chamou a minha atenção em Jean-Michel Basquiat: The Radiant Child foi a caracterização desse homem como uma criança genial. Ao observarmos seu trabalho, não é possível negar a inteligência e o brilhantismo de Basquiat, no entanto, as imagens de arquivo o mostram com uma alegria infantil, comportamentos inocentes e uma maneira simples de lidar com o mundo. O mesmo texto abre e fecha o filme. No começo, ele parece uma justificativa para o título. Ao final, ele faz todo o sentido.

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