Divagações: RoboCop (1987)

Em uma tentativa de me preparar para o próximo projeto do diretor José Padilha , eu resolvi assistir a RoboCop . Confesso que lembrava ap...

Em uma tentativa de me preparar para o próximo projeto do diretor José Padilha, eu resolvi assistir a RoboCop. Confesso que lembrava apenas vagamente de algumas cenas, de modo que foi quase como ver o filme pela primeira vez. Assim, ao mesmo tempo em que posso me surpreender com os acontecimentos, não tive aquela nostalgia que nos faz perdoar muitas falhas dos filmes que nos são queridos.

A história é bem simples e o filme não se perde com enrolações. Em um futuro distópico, a cidade de Detroit foi totalmente dominada pelo crime e existe um plano de construir uma nova cidade por cima da antiga (ou algo assim, não me perguntem!). No entanto, para colocar a ideia em prática, é preciso dar uma contida básica na violência.

A princípio, Dick Jones (Ronny Cox) seria o responsável por implantar o projeto de um robô, mas seu protótipo falha e o ambicioso Bob Morton (Miguel Ferrer) ganha sua chance – eis que entra em cena RoboCop (Peter Weller). Na verdade, ele era um policial comum chamado Alex Murphy, que é brutalmente mutilado por Clarence Boddicker (Kurtwood Smith), um homem perigoso e com contatos importantes no alto escalão. O detalhe é que o homem por baixo da máquina começa a recuperar sua memória (e o trauma).

Quando colocado dessa forma, pode até parecer que existem camadas de complexidade em RoboCop, mas é tudo muito simples. Ninguém com algum poder é decente e ética é uma palavra com significado desconhecido. A sociedade é completamente alienada e todos continuam suas rotinas, mesmo sem saber se estarão vivos no dia seguinte. Não é um mundo feliz, mas é um cenário excelente para um filme que pretende apenas explorar um conceito, sem a necessidade de levantar grandes discussões, trazer uma moral ou ser difícil.

RoboCop, aliás, era um filme relativamente comum em sua época, embora tenha uma narrativa um pouco estranha para os padrões atuais. Não há preocupação em apresentar os personagens justamente porque não há complexidade em nenhum deles. Embora aconteçam tiroteios frequentes, o filme não possui cenas de lutas elaboradas e nem perseguições (a propósito, o protagonista é lento e pouco flexível).

Mesmo assim, a produção resistiu bem ao tempo. Os momentos mais ‘difíceis’ de assistir envolvem robôs que foram animados com um stop motion muito perceptível, mas a lataria do protagonista não chega a incomodar e as armas exageradamente potentes e gigantescas até que são interessantes. Além disso, como a premissa ainda se encaixa com as possibilidades que temos para o nosso mundo (!), dá para embarcar sem muitos questionamentos.

Há quem perceba o filme como uma metáfora para o funcionamento das grandes corporações. Por mais que elas possam ser cruéis e desumanas, acredito que interpretar RoboCop exclusivamente dessa forma é viajar um pouco longe demais. Não que a questão seja inválida, afinal, o diretor Paul Verhoeven sabe utilizar muito bem suas ficções para criticar pontos específicos da sociedade – além disso, se o filme não fizesse algo assim, dificilmente o público criaria um vínculo com a obra.

Obviamente, uma releitura dessa história e um orçamento mais caprichado podem fazer milagres. Contudo, o grande mérito de RoboCop está justamente em sua simplicidade. O filme tem pouco mais de 100 minutos e não perde tempo em explicar o que aconteceu para que a situação chegasse àquele ponto – as coisas simplesmente são. Assim, espero que a produção de 2014 consiga manter o que esse filme tem de bom, tornando-o melhor tecnicamente e artisticamente, mas sem perder a distopia.

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