Divagações: Sunrise - A Song of Two Humans

Não é de hoje que diretores de diversas partes do mundo vão até os Estados Unidos para realizar produções em inglês. O alemão F.W. Murnau...

Não é de hoje que diretores de diversas partes do mundo vão até os Estados Unidos para realizar produções em inglês. O alemão F.W. Murnau, mais conhecido por seu uso da luz – e por filmes sombrios –, lançou Sunrise: A Song of Two Humans em 1927, um ano após firmar contrato com a Fox.

A produção trouxe pouco retorno financeiro para o estúdio, mas o prestígio que acompanhava o nome do diretor foi bem-vindo. Lançado no mesmo ano que The Jazz Singer, o filme conta com uma trilha sonora gravada e alguns efeitos sonoros, mas não é falado, o que diminuiu muito do seu apelo à época. Isso não impediu que ele levasse para casa três prêmios no Oscar: Melhor Filme - Produção Artística Única (categoria que só existiu naquela edição), Melhor Atriz e Melhor Fotografia, além de uma indicação a Melhor Direção de Arte.

Tudo começa quando uma mulher da cidade (Margaret Livingston) se estabelece em uma comunidade rural por um período que vai além das férias usuais. O motivo é um relacionamento com um homem casado (George O'Brien), a quem ela tenta convencer a vender a fazenda e a matar sua esposa (Janet Gaynor). A princípio, o homem parece estar de acordo com o plano, mas o remorso começa a corroê-lo – infelizmente, ele não muda de ideia até a esposa entender o que está prestes a acontecer.

A partir dessa premissa, Sunrise: A Song of Two Humans se transforma em uma história de redenção hollywoodiana. A postura corporal dos atores, a iluminação e os cenários contam a história em conjunto e se complementam. Por mais que tudo pareça acontecer muito rapidamente, trata-se de uma longa noite, cheia de novas experiências para os protagonistas e os sentimentos são compreensíveis, principalmente quando se leva em consideração a época.

Um aspecto interessante é como o diretor tem controle sobre o que é colocado na tela. Todas as cenas foram filmadas em estúdio (inclusive as sequências na cidade), o que permitiu um controle total da iluminação. Além disso, foram realizadas inúmeras trucagens, com o negativo sendo parcialmente exposto duas vezes, de modo a criar sobreposições e outros efeitos que funcionam muito bem (acredite, o resultado é melhor que alguns efeitos especiais atuais).

Outra característica que deve ser observada em Sunrise: A Song of Two Humans é a forma como Murnau utiliza os letreiros. Normalmente usados para explicitar diálogos, eles não eram um recurso apreciado pelo diretor, que os utiliza muito pouco e de uma forma criativa, com repetições e leves alterações que ressaltam os efeitos dramáticos da cena em questão.

A trilha sonora, obviamente, também é um destaque. A produção foi a primeira em longa-metragem a utilizar o sistema Fox Movietone, o que significa que este foi o primeiro filme a ter efetivamente uma faixa de áudio própria. Isso fica bem claro nas primeiras cenas, com os efeitos sonoros de um trem. Outros momentos também sincronizam gestos e música, o que é bastante interessante e demonstra que o cinema realmente não poderia evitar os diálogos por muito mais tempo.

Emocionante, sensível e extremamente ligado com a cultura de sua época, Sunrise: A Song of Two Humans é um filme que ainda consegue se comunicar com os espectadores. Por mais que sua tecnologia esteja ultrapassada, o cuidado na produção fez com que a obra tenha envelhecido com dignidade.

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