Divagações: Gran Torino

Lembro de ter visto Gran Torino no cinema – há mais de seis anos – e pensado “preciso rever”. Demorei bem mais do que eu gostaria, mas n...

Lembro de ter visto Gran Torino no cinema – há mais de seis anos – e pensado “preciso rever”. Demorei bem mais do que eu gostaria, mas nunca esqueci essa ideia. Esse é um filme pesado, mas com uma história aparentemente simples – só aparentemente.

Walt Kowalski (Clint Eastwood) é um mal humorado veterano da guerra da Coreia. Ele acabou de perder a esposa, não tem paciência para o padre que começa a atormentá-lo, Janovich (Christopher Carley), e nem ao menos se preocupa em manter relações amistosas com os filhos (Brian Haley e Brian Howe). Ele está muito bem sozinho com seu Gran Torino 1972. Contudo, o mundo não parou. Seu bairro se tornou reduto de imigrantes e ele acaba envolvido com uma família Hmong.

Na casa ao lado, Sue (Ahney Her) é uma jovem alegre que consegue conciliar tradições, estudos e uma vida normal nos Estados Unidos. Por sua vez, seu irmão Thao (Bee Vang) precisa de ajuda. Ele é quieto, não tem amigos e não consegue se enturmar com a gangue de seu primo. Aliás, o rapaz é constantemente ‘xingado de mulher’ por ser educado, ajudar em casa e querer ser mais independente.

Há uma moral bem forte em Gran Torino. A princípio, temos personagens cheios de preconceitos por todos os lados. Nenhum deles vai ser ‘curado’. Eles continuam vivendo em uma sociedade com princípios arraigados e acreditam estar certos em suas crenças. Mas isso não quer dizer que eles não sejam capazes de se identificar com outro ser humano, aprendendo e se emocionando com as aventuras e desventuras alheias.

E esse é um ponto bem interessante: o filme não quer mudar quem as pessoas são, principalmente porque sabe que não tem o poder de mudar a trajetória de ninguém. Ao mesmo tempo, sempre é possível encontrar caminhos inesperados pela vida. Talvez não seja a postura mais adequada ou politicamente correta, mas é um modo de perceber as coisas.

A propósito, Gran Torino foi acusado de ‘exagerar aspectos culturais para fins dramáticos’, de não ser fiel às tradições do povo Hmong e de preconceito entre membros brancos da equipe e atores Hmong. Sinceramente, isso é triste e não muito legal para a reputação da produção. É possível dizer que isso é esperado em um longa-metragem de ficção e que envolve uma grande quantidade de pessoas, mas isso continua não sendo uma desculpa válida.

Dirigido por Clint Eastwood que, na época, ameaçava se aposentar da atuação, o filme teria sido uma bela despedida para uma carreira cheia de personagens durões e com ares de anti-herói. Fico feliz porque ele ainda não parou, mas gostaria que esse filme tivesse algum empurrão para permanecer na memória dos cinéfilos (é isso que dá criar um carinho especial!). Não que a obra tenha sido esquecida, visto que permanece na lista dos 250 melhores filmes do site IMDb, mas seria interessante se ela fosse mais revista.

O roteiro de Nick Schenk é bastante enxuto e permite que o público perceba as várias camadas existentes nos três personagens principais. Além disso, o texto consegue ser extremamente dramático e tenso, mas capaz de se abrir para momentos mais leves ou até cômicos quando necessário. O ritmo do filme é muito dependente do texto, que não decepciona.

Gran Torino não é um filme masculino, é um drama humano sobre como somos tortos, errados e imperfeitos. Ao mesmo tempo, também conta uma história de amor e redenção. Óbvia? Talvez, mas emocionante mesmo assim.

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