Divagações: Crimson Peak

Do repentino cancelamento de Silent Hills até os constantes problemas que a adaptação de At the Mountains of Madness vem sofrendo com o ...

Do repentino cancelamento de Silent Hills até os constantes problemas que a adaptação de At the Mountains of Madness vem sofrendo com o passar dos anos, é claro que Guillermo del Toro não vem tendo lá muita sorte em emplacar os seus projetos de horror – quer seja por problemas de produção, pressão do estúdio ou até mesmo pela ojeriza dos produtores a um R Rating, que restringe a presença de menores de 17 anos no cinema.

Neste ambiente hostil, é de surpreender que Crimson Peak tenha conseguido ver a luz do dia, principalmente quando percebemos que o filme exibe a mesma classificação indicativa que há tempos vem sendo uma pedra do sapato do diretor. Mas não é que concessões não tenham sido feitas, já que a produção não pega diretamente na veia da escola de horror opressivo e surreal que permeia a filmografia de Del Toro. Ainda assim, é a nossa chance de ver o que o diretor pode fazer em sua versão mais hollywoodiana.

Passado durante o final do século XIX, Crimson Peak acompanha Edith Cushing (Mia Wasikowska), uma americana aspirante a escritora com uma pontinha de interesse pelo sobrenatural. Sua vida pacata nos Estados Unidos acaba quando ela conhece o charmoso Thomas Sharpe (Tom Hiddleston), um aristocrata britânico que busca, junto de sua irmã Lucille (Jessica Chastain), recuperar a fortuna da família. Apaixonada por Thomas e sob a desaprovação de sua família e de seu amigo de infância, Dr. Alan McMichael (Charlie Hunnam), Edith vai para a Inglaterra, onde conhece a mansão dos Sharpe. Porém, não leva muito tempo para ela perceber que a propriedade decadente esconde uma história trágica e muitos segredos.

Surpreendentemente, o filme já deixa bem claro desde o início que esta não é uma história de terror. Em uma espécie de comentário metalinguístico dos personagens já compreendemos que essa não é uma história de fantasmas, mas sim uma história com fantasmas. Bebendo da fonte dos romances góticos e vitorianos, vemos que o que realmente importa aqui é a dimensão humana dos personagens – mesmo que, nas palavras da própria protagonista, estejamos mais próximos a uma Mary Shelley do que a uma Jane Austen.

Essa referência transparece na composição dos cenários e na própria edição, que apresenta uma transição de cenas marcada para funcionar como o fechamento de um capítulo, remetendo não somente à literatura, mas também ao cinema de horror dos anos 1960 e 1970 (sobretudo ao trabalho do italiano Mario Bava, de quem Del Toro é um grande fã). O resultado é em uma obra extremamente bem-acabada e criativa do ponto de vista técnico, com uma ambientação que é sem dúvida digna de elogios. A mansão onde a história se passa, por exemplo, é uma das locações mais impressionantes que já vi no cinema, sendo que o nível de detalhes é simplesmente absurdo.

Contudo, é justamente na história que Crimson Peak acaba escorregando um pouco. A trama é um pouco previsível e a maneira como tudo se desenvolve a partir do segundo ato simplesmente interrompe as chances dos personagens se mostrarem interessantes e tridimensionais. Falta peso ao drama, sutileza à maneira como a trama é contada e, acima de tudo, falta o clima de suspense e a atmosfera de tensão tão necessários a esse tipo de história, que, na sua ânsia de ser um “filme de terror só que não”, acaba levando o “só que não” a sério demais.

O longa-metragem é uma experiência narrativa interessante, visualmente muito impactante, com um bom elenco (destaque para Tom Hiddleston e Jessica Chastain, ambos ótimos em seus papéis) e tecnicamente impecável. Porém, o resultado final acaba não sendo tão memorável ou particularmente inovador, faltando uma pegada um pouco mais autoral.

Para quem não tem especial interesse pelo gênero ou não está tão afim de analisar tecnicalidades, talvez Crimson Peak não seja a melhor pedida, mas considerando a entressafra de grandes lançamentos e a proximidade ao Dia das Bruxas, certamente o filme merece alguma consideração, afinal, a experiência dificilmente será a mesma fora dos cinemas.

Outras divagações:

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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