Divagações: Me and Earl and the Dying Girl

Quando você assiste a um filme como Me and Earl and the Dying Girl logo após ter perdido alguém, toda a sua percepção sobre a obra é alte...

Quando você assiste a um filme como Me and Earl and the Dying Girl logo após ter perdido alguém, toda a sua percepção sobre a obra é alterada. Gostaria muito de chegar aqui e dizer que se trata de um filme bonitinho, onde o trabalho de jovens atores se destaca, digno de sua posição de favorito em festivais e que traz uma visão leve sobre um assunto pesado. Inclusive, até acredito que esse longa-metragem seja todo isso. Mas, para mim, ele foi apenas mais um tijolo de tristeza em um muro que eu mesma estava construindo ao meu redor.

Resolvi adiar o momento de escrever esse texto porque gostaria de olhar a produção a partir de um distanciamento mais frio. Entretanto, percebi que, além disse ser um tanto quanto impossível, isso não seria justo nem comigo e nem com o filme. Esse é um longa-metragem sobre o nosso despreparo em lidar com a morte e o impacto que sua foice inevitável – e, misteriosamente, lenta e veloz ao mesmo tempo – traz para nossos corações.

Greg (Thomas Mann) é um adolescente que evita se envolver. Na escola, ele não frequenta o refeitório e procura manter relações minimamente amigáveis com todas as panelinhas, sem efetivamente participar de nenhuma. Sua única amizade mais próxima é com Earl (RJ Cyler), que conhece desde a infância, e com quem passa o tempo livre fazendo paródias de clássicos do cinema.

Um dia, sua mãe (Connie Britton) o obriga a se aproximar de Rachel (Olivia Cooke), uma colega de escola que está com câncer. A menina está em tratamento e as chances de recuperação são grandes, mas os momentos são difíceis. Ainda assim, os dois começam a conversar e a desenvolver uma amizade repleta de solidariedade e desinteresse. A relação poderia até mesmo se transformar em um romance, mas a palavra 'câncer' é pesada demais para ambos.

Enquanto Greg tenta entender o que está acontecendo e transformar em um filme, vemos a amizade florescendo cada vez mais, a mãe de Rachel, Denise (Molly Shannon), começando a beber além da conta e a saúde da garota se deteriorando. Novos conflitos surgem, o mundo cuidadosamente construído de Greg desaba ao seu redor e o amadurecimento do rapaz acaba vindo de uma forma forçada, não natural. Me and Earl and the Dying Girl é um filme em que você sabe o que está por vir, mas – assim como o protagonista – não quer que essas coisas realmente aconteçam.

Tudo isso é rodeado de uma comicidade que soa estranha, que joga na cara o quanto o mundo não faz sentido e a realidade é simplesmente irônica. Talvez essa não fosse exatamente a intenção do diretor Alfonso Gomez-Rejon, mas a verdade é que ele mesmo criou o mundo aparentemente bonitinho de Greg com discrepâncias chocantes que aparecem apenas em detalhes e que ele está se recusando a encarar, inclusive em sua amizade com Earl e até dentro de sua própria casa.

Vou citar um exemplo. Em um momento, a principal preocupação dos pais é que o filho preste solidariedade para uma colega em sofrimento; em outros, eles parecem se arrepender dessa decisão por causa de uma vaga na universidade. Ao mesmo tempo em que acreditamos que o convívio com o outro é o que mais importa, relutamos em abrir mão de nossa própria felicidade (e de nossas próprias pequenas conquistas ou até mesmo picuinhas) para fazer isso.

Me and Earl and the Dying Girl apresenta a morte para uma geração que se recusa a se envolver emocionalmente, que simplesmente não quer lidar com as consequências de cativar outro ser humano, de tornar uma pessoa sua responsabilidade. Mas isso eventualmente acontece, não conseguimos evitar. E é bonito enquanto dura.

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