Divagações: I Don't Feel at Home in This World Anymore

Todo mundo que já foi assaltado pelo menos uma vez na vida sabe como é se sentir inseguro e invadido. Também sabe que o problema não é nec...

Todo mundo que já foi assaltado pelo menos uma vez na vida sabe como é se sentir inseguro e invadido. Também sabe que o problema não é necessariamente o objeto que foi roubado (dependendo do valor e dos problemas que o assalto vai causar, claro), mas a sensação de que alguém chegou muito perto e tirou algo que é seu, que foi comprado com o seu dinheiro ou dado por alguém de quem você gosta, e pelo qual você nutria algum carinho.

I Don't Feel at Home in This World Anymore é um filme que traz as consequências de um assalto na vida de uma mulher. Ruth (Melanie Lynskey) é uma pessoa boa e correta, daquelas que juntam o lixo alheio para jogar na lixeira, que não reclama quando alguém fura fila no supermercado, que não contam spoilers e que engolem muito sapo por conta disso. Um dia, sua casa é assaltada. O ladrão leva seu computador, as joias de sua avó e seus remédios controlados. A polícia vem, olha a casa, faz perguntas constrangedoras, recomenda que ela tome mais cuidado e sai. Fica bem claro que ninguém vai tentar recuperar suas coisas ou descobrir quem entrou na casa.

É então que aquela pessoa tranquila e que nunca fez mal a ninguém resolve agir. A princípio, seus atos parecem patéticos – como fazer uma cópia da pegada que encontrou em seu quintal e recrutar a ajuda do vizinho esquisitão, Tony (Elijah Wood). Contudo, aos poucos, Ruth consegue pistas não apenas sobre seus objetos roubados, mas também sobre o ladrão em si, Christian (Devon Graye).

A questão é que I Don't Feel at Home in This World Anymore não se restringe apenas à jornada de Ruth – e é aí que reside o maior problema do filme. A produção tem uma protagonista absolutamente normal e pé no chão, que dita o tom dos primeiros minutos da produção e com quem todo mundo consegue se identificar, em maior ou menor grau. Melanie Lynskey consegue vencer o incrível desafio de interpretar uma pessoa comum e fazer isso parecer algo interessante ao mesmo tempo.

Entretanto, todos os demais personagens trazem um nível de bizarrice que não parece coexistir bem no universo de Ruth. Além de Tony – com sua infantilidade e falta de noção – há também o próprio ladrão e seus amigos, que estão envolvidos em algo maior e mal explicado. E, sinceramente, o que cada um deles está fazendo é bastante dispensável para o decorrer da história.

Ou seja, não é à toa que Ruth não esteja se sentindo em casa nesse mundo – e eu me surpreendo por ela ter aguentado tanto tempo sem pirar completamente. Os únicos que talvez escapem disso são o policial (Gary Anthony Williams), ainda que o personagem seja bastante caricato, e o casal de amigos da protagonista (Lee Eddy e Matt Orduna). Mas, de qualquer modo, é estranho que I Don't Feel at Home in This World Anymore tenha um apego tão forte a excentricidades e idiossincrasias.

Com essa abordagem irregular, o longa-metragem incomoda um bom tanto. O que salva é a história, que não deixa de ser cativante (e que tem uma atenção particular aos detalhes), e o elenco. Ainda que Lynskey seja realmente a única que está levando tudo a sério, é sempre bom ver Elijah Wood fazendo maluquices. Além disso, Christine Woods também merece uma menção honrosa ao interpretar uma mulher riquíssima que é visitada pela protagonista durante a investigação.

Assim, apesar de suas falhas, I Don't Feel at Home in This World Anymore é um daqueles filmes que merecem ser descobertos em um dia em que você não quer uma comédia, mas também não está a fim de um drama pesado. Por ser uma produção independente, o diretor e roteirista Macon Blair se deu à liberdade de arriscar mais – e isso é algo que sempre deve ser incentivado no cinema. Ironicamente, cada vez menos gente pode pagar para ver coisas assim na telona, então, essa é mais uma produção que chegou ao público por meio da Netflix.

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