Divagações: The Square

Vencedor da Palma de Ouro em Cannes , The Square foi escolhido para representar a Suécia na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Osca...

Vencedor da Palma de Ouro em Cannes, The Square foi escolhido para representar a Suécia na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar 2018 e esteve presente nas principais premiações da temporada. Ainda assim, esse é um daqueles filmes que nem ao menos tem a ambição de alcançar o grande público. Ele fala sobre arte, criação, desigualdade social, comportamento, moral e controvérsias de uma maneira satírica e que carece de uma história com formatação tradicional – começo, meio e fim –, preferindo ser ele mesmo uma parte do que pretende retratar.

A história se passa majoritariamente ao redor do curador-geral de um museu de arte contemporânea, Christian (Claes Bang). Ele já começa a história sendo assaltado e, a partir daí, mais coisas começam a dar errado em sua vida pessoal e profissional. Em casa, suas filhas brigam constantemente. Amorosamente, ele se enrola com uma jornalista que tem uma personalidade muito distinta da sua (Elisabeth Moss). No trabalho, uma campanha polêmica é aprovada sem que ele dê a devida atenção e traz grandes repercussões. E, como se não bastasse, pequenos problemas negligenciados se transformam em bolas de neve.

Mas, no fundo, o ‘inferno astral’ do protagonista não é exatamente o que importa em The Square. Ao versar sobre a confiança e o respeito que as pessoas têm umas pelas outras (justamente o tema de uma exposição a ser lançada), o longa-metragem discorre sobre o tópico a partir de muitos enfoques, trazendo uma amplitude que raramente é vista no cinema.

Christian, aliás, é uma pessoa que pensa demais sobre si mesmo e o mundo que o rodeia. Suas reflexões são apresentadas ao longo do filme em diálogos muito bem colocados, em suas reações aos acontecimentos e até mesmo em um estranho monólogo gravado no celular. Ele aborda sua própria e inegável realidade de homem branco privilegiado, a situação dos mendigos (fortemente presentes durante todo o filme), suas relações de trabalho e a própria futilidade de tudo o que o cerca.

Com isso, The Square consegue gerar inúmeras questões, trazendo uma visão que não esclarece totalmente os pontos tratados – até porque eles não são exatamente vistos pelos personagens como problemas a serem solucionados por eles. Mas, mesmo assim, a produção ilumina alguns caminhos e outras tantas ironias da vida.

Vale observar que o roteiro e a direção são de Ruben Östlund, que não economizou na hora de fazer sua pesquisa. A própria exposição The Square, que aparece na história e dá título ao filme, contou com um estudo preliminar no museu Vandalorum em 2015. Além disso, o personagem Oleg (Terry Notary) é baseado no artista russo Oleg Kulik, que efetivamente fez uma performance na Suécia com um desfecho similar (mas não idêntico!) ao visto no filme. Ou seja, mesmo os momentos mais absurdos têm fortes âncoras na realidade (sim, inclusive o macaco, que é uma referência a Pierre Brassau).

Dessa forma, The Square é um daqueles filmes inegavelmente cabeçudos, pretensiosos e muito longos. Ele levanta mais questões do que responde e tem um estranho e tolerante carinho por seus personagens, ao mesmo tempo em que não exige um comprometimento emocional real com nenhum deles. Afinal, embora fale sobre a importância de se confiar nas pessoas, ele também comenta a desconfiança, a intolerância, o egoísmo e a arrogância. Assim, se você pensar demais sobre o que acontece na tela, pode acabar confuso e com dor de cabeça, contudo, essa não deixa de ser uma daquelas produções feitas especialmente para ser acompanhada de uma roda de discussões na sequência.

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